Primeiras-damas do Brasil (Parte IV): Maria Thereza Goulart, bela e exilada

Maria Thereza Goulart. Imagem: Reprodução.

Por Marllon Alves

Maria Thereza Goulart é considerada até a atualidade uma das primeiras-damas mais belas que o Brasil já teve. Oriunda de uma família com relativo poder aquisitivo, fez parte e manteve contato com as famílias mais tradicionais da política brasileira de então. Maria Thereza foi uma primeira-dama bastante popular, mas o golpe civil-militar de 1964 que depôs o esposo João Goulart encurtou o tempo de duração de seu posto como primeira-dama.

            Maria Thereza Goulart nasceu em São Borja, no estado do Rio Grande do Sul, em 1936. Ela era vizinha de João Goulart, seu futuro marido. Maria conheceu Jango quando tinha 14 anos de idade (por sua vez, o então futuro presidente do Brasil deveria ter mais de 30 anos quando conheceu sua futura esposa, uma vez que o mesmo era aproximadamente 17 anos mais velho que a mesma). A família de Maria Thereza tinha conexões com os parentes do então presidente Getúlio Vargas e, alinhada com as famílias tradicionais da região, Maria Thereza passou a se aproximar cada vez mais de João Goulart. Ainda discorrendo sobre as “redes de sociabilidade” de Maria Thereza, chama a atenção o fato de uma de suas tias, América Fontella, ter sido casada com Spartacus Dornelles Vargas, irmão de Getúlio Vargas. Yara Vargas, sobrinha de Getúlio Vargas e uma das fundadoras do PDT (Partido Democrático Trabalhista), foi assessora de Maria Thereza na LBA (Legião Brasileira de Assistência). Yara e Maria Thereza eram primas. Além disso, Maria Thereza conheceu Leonel Brizola aos 12 anos de idade. Brizola se casou com Neuza Goulart Brizola, irmã de João Goulart.

            O relacionamento amoroso entre Maria Thereza Goulart e João Goulart começou quando esta conclui seus estudos. Neste contexto, Jango era Ministro do Trabalho de Getúlio Vargas. Já o casamento ocorreu no ano de 1955, quando o mesmo concorria à vice-presidência. Por conta de viagens e uma tempestade, o casamento de ambos foi consumado oficialmente por procuração. Tal união surpreendeu muita gente porque João Goulart tinha a fama de se relacionar com várias mulheres ao mesmo tempo. João e Thereza se tornaram um casal modelo da época, vistos como referência de casal jovem e bem-sucedido. Por conta deste fato, o casal em questão apareceu em diversas publicações de moda e política; e Maria Thereza chegou a ser comparada com Jackie Kennedy, esposa do então presidente dos EUA John Kennedy, morto no ano de 1963 cuja morte nunca foi de fato esclarecida.

João Goulart e Maria Thereza na década de 1950. Imagem: Reprodução.

            Maria Thereza sofria com síndrome do pânico e ansiedade, fato que a levou a situações conturbadas em mais de uma ocasião. Por conta de sua personalidade reclusa, contrair matrimônio com um líder populista não foi fácil. Entretanto, Thereza sempre esteve ao lado do esposo. Mesmo quando era primeira-dama, Thereza não deixou de se dedicar a sua carreira, adentrando no universo da alta costura. Criando obras de sucesso, tornou-se novamente um fenômeno midiático, dentro e fora do Brasil. Thereza chegou a ser considerada a primeira-dama mais linda do mundo.

            João Goulart era vice-presidente do Brasil, chegando ao posto máximo da política brasileira depois que Jânio Quadros abandonou a cadeira presidencial acusando as “forças terríveis” de o levarem à prática deste ato. Desta forma, João Goulart tornou-se Presidente da República e Maria Thereza primeira-dama. Era um período turbulento que desembocaria no golpe civil-militar de 1964. Os setores da sociedade que forçavam a renúncia de Getúlio Vargas (o então presidente preferiu o suicídio à renúncia) voltaram a se organizar, uma vez que o ato de Getúlio adiou a implantação de um golpe. Os anos de 1961 a 1964, quando João Goulart ocupava o posto máximo da política brasileira, foram marcados pelo instável equilíbrio entre os partidos. De um lado havia a ruptura do pacto populista (expresso principalmente através da associação entre PSD e PTB) e do outro a participação popular não tutelada no universo político. A expressão partidária destes movimentos (focados nas reformas de base, especialmente a Reforma Agrária) demonstrava com clareza os perfis ideológicos dos parlamentares. A atuação destes segmentos e a formação de frentes interpartidárias traziam mais transparência à disputa política, evidenciando as rachaduras no interior da classe dominante e expondo as contradições de classe, independente do espectro partidário. As reformas de base e a luta anti-imperialista eram as grandes polêmicas deste período.

            João Goulart estava disposto a levar adiante as reformas de base e as mesmas foram anunciadas em um veemente discurso em março de 1964 em um evento que entrou para a posteridade como “Comício da Central do Brasil”, que reuniu aproximadamente 200 mil pessoas. Tendo de lidar com seus distúrbios mentais e assustada diante de tamanha multidão, Thereza recusou-se a sair de perto do marido, o apoiando e colaborando com os discursos do então presidente. João Goulart estava disposto a levar as reformas de base adiante e não queria concessões. As forças que orquestraram o golpe de 1964 agiram e no dia 01 de abril de 1964 João Goulart foi destituído da cadeira presidencial. Tal golpe tinha o objetivo de reprimir os movimentos populares e afirmar “a hegemonia do capital monopolista sobre os demais segmentos” (FONTES e MENDONÇA, 1991: p. 15).

Maria Thereza ao lado de João Goulart durante comício na Central do Brasil, cidade do Rio de Janeiro, poucas semanas antes do Golpe de 1964. Imagem: Reprodução.

            Com a implantação de uma ditadura civil-militar, Jango e Thereza foram para o exílio junto com os filhos João e Denise Goulart. O destino escolhido foi o Uruguai. Apesar das dificuldades, o exilio forçado trouxe alivio para Thereza, uma vez que sua personalidade reclusa não condizia com o posto que o marido ocupava. Apesar do alivio, Thereza não nega que o golpe e o exilio foram muito difíceis para ela porque esta teve de se despedir “sem poder dizer adeus” de seus amigos, familiares, casa e país. A incerteza passou a ser uma constante na vida de Thereza e sua família. A agora ex-primeira-dama vivia atravessando a fronteira gaúcha ilegalmente, fazendo com que fosse presa em algumas situações. Em uma destas, foi obrigada a ficar nua na frente de um oficial. Thereza nunca contou o fato a João Goulart, que morreu em 1976.

Conclusão

            Avessa a entrevistas, Maria Thereza seguiu sua vida em reclusão, sem abandonar sua vida social e pouco falando sobre seu passado. Em 2008, depois de um processo judicial que durou quatro anos, Maria Thereza e João Goulart receberam anistia política. Era a primeira vez que um ex-presidente havia sido anistiado por perseguição política. A ex-primeira-dama passou a receber uma pensão mensal e uma indenização por ter sido impedida de voltar ao Brasil por 15 anos.

Referências:

– FONTES, Maria Virginia; MENDONÇA, Sonia Regina de. História do Brasil reccente: 1964-1980. 2ª ed. São Paulo: Editora Ática, 1991. 87p.;

– SCHWARCZ, Lilia Moritz; STARLING, Heloisa Murgel. Brasil: uma biografia. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2015. 694p.;

https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/reportagem/do-exilio-conturbado-a-prisao-abusiva-maria-thereza-goulart-mais-bela-primeira-dama-do-brasil.phtml visualizado no dia 27/09/2022.

Como citar este texto:

– ALVES, Marllon. Primeiras-damas do Brasil (Parte IV): Maria Thereza Goulart, bela e exilada. In: Gênero e História. Disponível em: https://generoehistoria.com/2022/10/09/primeiras-damas-do-brasil-parte-iv-maria-thereza-goulart-bela-e-exilada/ publicado no dia 09/10/2022.